Considerado bandeira política da presidente Dilma, programa teve um gasto de R$ 15,6 milhões com publicidade; é a primeira vez que uma única iniciativa do MEC concentra tantos recursos
Roberto Stuckert Filho/PR

Dilma entrega diploma à formanda do curso de preparador de doces do Pronatec ao lado do ministro da educação Henrique Paim (à esq. da formanda) durante cerimônia em Vitória (ES)

Dos R$ 28 milhões gastos em publicidade na divulgação de 22 programas e ações do Ministério da Educação (MEC), mais de 55% foram concentrados em apenas uma iniciativa: no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). Em 2013, o programa teve um gasto total de R$ 15,6 milhões com publicidade.

Esses recursos reservados ao Pronatec foram utilizados para arcar com as despesas de produção e veiculação de anúncios nos meios de comunicação. Pelo menos nos últimos cinco anos, é a primeira vez que um programa concentra tantos recursos. O recorde de 2012 foi do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que consumiu 25% dos gastos, num total de R$ 7,6 milhões.

Todos os dados são oficiais e estão presentes em documentos elaborados pela Secretaria Executiva do MEC aos quais o iG Educação teve acesso. A posição mais recente do documento que contém os gastos em campanhas, intituladas como sendo de utilidade pública, é datada de março de 2014. 

Acompanhe mais notícias no canal iG Educação
Siga o iG Educação pelo Twitter
Fique por dentro de outras notícias pelo facebook do InfoEscola

Enquanto o gasto com o Pronatec ultrapassa os R$ 15 milhões, os recursos para a campanha publicitária do Plano Nacional de Educação (PNE) – sancionado em junho pela presidente Dilma – representa apenas 0,1%. Em 2013, foram gastos somente R$ 45 mil em campanhas que visavam mobilizar a sociedade – incluindo os pais, professores e alunos – para a discussão do PNE. O gasto se limitou, basicamente, à criação de livretos.

“Em geral, a publicidade de utilidade pública é mais voltada à propaganda que à comunicação social. Durante a tramitação do PNE [iniciada no final de 2010], foi um equívoco do governo não ter trabalhado o plano como estratégia de comunicação social, tendo em vista que o PNE vai alterar o planejamento de todas as áreas da educação no País”, afirma Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Veja também:
‘Foram 7 anos de luta; vencemos’, diz líder da aprovação do PNE após sanção
Maior desafio do PNE será destinar 10% do PIB para a educação
Apenas 29% dos municípios têm planos de metas e ações para a educação
Conheça as 20 metas do Plano Nacional de Educação

Plataforma política

O Pronatec – que já conta com quase 7,5 milhões de matrículas – é tido como uma das principais plataformas políticas na área de educação da presidente Dilma Rousseff. Segundo especialistas, uma das intenções do governo – com tamanho gasto em publicidade – é associar a marca do programa à figura da presidente, candidata à reeleição. Algo parecido com o que ocorreu com o ex-presidente Lula, que teve a expansão do número de universidades federais associada à sua imagem.

“É uma estratégia de marketing. Com um programa como esse [o Pronatec], o governo consegue atingir dois tipos de eleitores-chave: o interessado na geração de emprego e o jovem, que é um público sempre difícil de alcançar”, diz o cientista político Rodrigo Mendes, professor de pós-graduação na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

+ Procurador pede multa a Dilma e ao PT por propaganda eleitoral antecipada

Reprodução/Secretaria Executiva do MEC

Peças de publicidade do Pronatec destacam papel do MEC na condução do programa

Oferecendo uma série de cursos técnicos e profissionalizantes, todos gratuitos, o Pronatec atinge, majoritaritariamente, jovens de 15 a 29 anos com ensino médio completo ou incompleto. No catálogo do programa também há uma série de treinamentos de curta duração voltados à qualificação profissional.

O uso da publicidade legal como instrumento de definição dos marcos da gestão de governantes também é destacado por especialistas como Gil Castello Branco, secretário geral da ONG Contas Abertas, especializada no controle de orçamentos públicos.

“Em geral, nas campanhas de publicidade de utilidade pública, há um intuito de tentar ganhar dividendos eleitorais. Os governos sempre tentam associar suas gestões a determinados programas”, explica Castello Branco.

A ênfase do MEC em propaganda sobre o Pronatec surge exatamente na época que antecede a campanha eleitoral. Em 2012, por exemplo, o programa não é listado nos gastos de publicidade de utilidade pública do ministério.

Divulgação/UniBH

Segundo Castro, os gastos em publicidade do MEC com o Pronatec são justificáveis

Faz sentido

Por outro lado, de acordo com o especialista em educação, Claudio de Moura Castro, o valor gasto em publicidade com o Pronatec “faz sentido”.

“Antes, o ensino técnico estava no limbo e o programa trouxe uma dinâmica nova para essa modalidade. Contudo, a propaganda não deve esconder os diversos problemas do Pronatec. Hoje, por exemplo, não há um controle sobre sua eficiência e o MEC não sabe quantos alunos ingressaram no mercado de trabalho após o curso. Não há, como em outros países, a obrigação da garantia do emprego ao aluno”, diz.

Castro cita alguns dos desafios que não foram resolvidos até então pelo programa, que deve ser expandido a partir de 2015 – caso Dilma seja reeleita. No “Pronatec 2.0”- como foi apelidado pela presidente, que recentemente vem reeditando uma série de relançamentos de programas -, são prometidas mais 12 milhões de vagas. Na primeira edição, a ser finalizada neste ano, a meta é de 8 milhões de matrículas.

Leia mais:
Com Pronatec 2, cursos poderão ser validados como crédito no ensino formal
´Pronatec 2.0´ terá oferta de 12 milhões de vagas a partir de 2015
‘Educação não é mercadoria: setor privado precisa de uma regulamentação urgente’

Um dos grandes desafios dessa possível segunda edição do Pronatec será resolver os problemas presentes ainda na primeira etapa. A evasão escolar que chega a 17% em algumas entidades que ofertam os treinamentos, a falta de infraestrutura adequada de cursos técnicos e a carência, em algumas localidades, de locais de estágios exigidos nas formações são alguns dos principais entraves.

Ciência sem Fronteiras

Outro programa que concentra boa parte dos gastos em publicidade é o Ciência sem Fronteiras (CsF) – ação que já concedeu mais de 80 mil bolsas para universitários brasileiros estudarem no exterior. O CsF é outra bandeira política que deve ser encampada pela candidata Dilma durante a propaganda política. A criação do programa se deu no primeiro ano de sua gestão.

Veja também:
Justiça derruba exigência do Enem de candidato ao Ciência sem Fronteiras
Confira 5 sites gratuitos focados no Toefl, o exame de inglês do Ciência sem Fronteiras

iG Educação (Especial)

Só de gastos de publicidade de utilidade pública do CsF foram consumidos quase R$ 2 milhões, o que representa quase 7% do gasto total de propaganda do MEC em 2013. Ele é o terceiro programa com mais recursos consumidos, fica atrás apenas do líder Pronatec e dos gastos com campanha do Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), programa voltado à alfabetização de crianças ao final do 3º ano do ensino fundamental, até os oito anos de idade.

+ Para professores, Pacto pela Alfabetização ‘chacoalhou’ educadores

O CsF e o Pronatec se distinguem, no entanto, pelo alcance de cada programa. A meta do Ciência sem Fronteiras, de enviar 101 mil estudantes para o exterior, é bem mais modesta que a meta do Pronatec, que prevê alcançar 8 milhões de candidatos até o final deste ano.

Thinkstock/Getty Images

Para o MEC, gastos em publicidade são justificados pela abrangência do Pronatec

Ministério da Educação

Consultado, o MEC informou que a pasta “priorizou, em 2013, a divulgação do Pronatec, devido a sua grande relevância social”.

A pasta disse ainda que a abrangência nacional do Programa, que chega a mais de 4 mil municípios, e a diversidade de seu público-alvo, que vai desde jovens até trabalhadores de diversas escolaridades e trajetórias profissionais, “exige divulgação em âmbito nacional”. O MEC ainda cita a importância do programa no processo de “expansão, democratização e interiorização da oferta de educação profissional e tecnológica no Brasil”.

O Ministério da Educação também informou que “é preciso considerar ainda que parte do material [de publicidade] produzido em 2013 está sendo utilizado em 2014”. A posição vai em direção ao que afirmou o ministro da educação Henrique Paim, quando questionado pela reportagem, durante evento realizado em São Paulo na última segunda-feira (7). “De certa forma, qualquer gasto que tenha sido feito nesta direção, certamente não foi para cobrir somente um ano. Deve ter sido para mais tempo”, disse Paim.

Os dados aos quais o iG Educação teve acesso, no entanto, informam que os valores referentes à publicidade do Pronatec se referem a gastos executados em 2013.

Balanço

A seguir, confira o balanço completo do “Pronatec 1”. Os dados têm como data base junho de 2014:

Fonte: Portal IG
Compartilhe