Lucy Andrade/Tribuna

 

Com uma jornada de trabalho diária de mais de sete horas, cumprindo um roteiro em média de seis corridas, que duram de 30 minutos até 3h, – em um trânsito caótico e vias adversas, –  os motoristas de ônibus, vez por outra, perdem  o controle e surtam.
Na última terça-feira, um motorista  da empresa Barramar, após ser fechado por outro veículo e ter sido provocado pelos passageiros que gritavam – “tira o pé do freio, pé de isopor”, entre outras “gozações”, se revoltou e abandonou o veículo na Rótula do Abacaxi, estacionando na Ladeira do Cabula.
O motorista, segundo a Superintendência de Trânsito e Transporte de Salvador (Transalvador), além de abandonar o veículo com os passageiros no meio da via, foi embora e jogou a chave pela janela. A empresa mandou outro veículo para levar o transporte.

No ano passado, o motorista Luis Antônio Santos, de 31 anos, jogou o ônibus no Dique do Tororó. Em outro episódio, o condutor ameaçou passar por cima de um  uma pessoa que dirigia um veículo menor. “Na semana passada, um motorista, no meio da assembleia, rasgou a farda e saiu de cueca. É muita pressão”, lembrou Francisco Costa.

O diretor de imprensa do Sindicato dos Motoristas e também motorista, Francisco Costa, disse que a demanda de trabalho é estressante e a pressão é muito grande. “A carga-horária de sete horas com apenas 20 minutos para o almoço e cafezinhos, cumprindo seis ou mais corridas por dia. O que piora a situação é o trânsito, que é infernal.

Outra coisa, se por um deslize o carro for preso, nós motoristas é que temos que pagar a multa para retirar. Se os pneus rasgarem na via, nós que arcamos. Se o ônibus for assaltado, o cobrador paga. É muita pressão para pouco dinheiro”, reclamou Costa.   

A assessoria de relações sindicais do Sindicato das Empresas de Transporte (Setps) disse que em um âmbito de 4 mil e 900 condutores de transporte público  que circulam na cidade, esses casos de “surto” são isolados e que raramente é em decorrência do trabalho.

“Estresse há em todo trabalho. Muitas vezes a pessoa está com problemas familiares e emocionais e não suporta, ai surta, mas acarretar a profissão é muito superficial, nesses casos é preciso fazer uma avaliação, saber da vida da pessoa. Já imaginou um médico ou um piloto abandonar o trabalho no decorrer da tarefa, porque está estressado com a função ou com o chefe?”, rebateu.

A assessoria do órgão também enfatizou que a carga horária de 44 horas, acordada com a categoria, está dentro da lei e que é normal, como a de vários trabalhadores. E que a demanda de trabalho está dentro das possibilidades que o motorista pode cumprir, e que a violência e o trânsito realmente representam um desafio diário.

Carga horária pesada

O Setps alega que a carga horária não é um problema para os motoristas, mas para a classe, essa é uma das principais queixas. Há, inclusive, um projeto de redução para 6 horas, assim como horário de almoço, que tramita na Câmara para ser votado.

“Há corridas que demoram 3 horas e só tiramos 15 a 20 minutos de descanso, tempo também para o almoço. Essas reivindicações já estão na Câmara e no Senado há muito tempo, mas nada é feito. Trabalhamos 13 dias para ter uma folga.

O salário base é uma vergonha, R$ 1.264, com os descontos reduz para R$ 900. A nossa meta é árdua”, reclamou Francisco Costa. Além das reivindicações, a categoria reclama de aumento salarial e melhores condições de trabalho, motivos que impulsionam as greves e paralisações, complicando a vida da população.

Além de enfrentar um trânsito lento, vias em condições precárias, os condutores também precisam ser cordiais ou educados para não desagradar os usuários que fazem todo tipo de pergunta e reclamações. Haja disposição para responder sempre a pergunta sobre o trajeto do ônibus, o porque da demora. E também paciência com aqueles que querem subir ou descer fora do ponto, que reclamam das curvas, do ônibus que está lotado, entre outras situações.

“Tem passageiro que reclama se estamos de cara emburrada. Às vezes, por exemplo, não escutamos o bom dia! Ou não estamos mais com paciência para responder, porque o dia todo dando bom dia, boa tarde, boa noite, por nada, tem hora que enche o saco – ai o passageiro esculhamba. Estamos expostos a todo tipo de situação, o corpo e a mente cansa. Mas trabalho nessa área porque gosto de dirigir”, disse o motorista Carlos Pereira, na profissão há 15 anos.

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