Reuters

No meio de uma semana repleta de compromissos oficiais no seu giro pelo Caribe, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem um encontro especial na tarde desta quarta-feira (24): ele visita o líder cubano Fidel Castro, em Havana. Segundo as fontes oficiais, será um “encontro entre amigos”. Mas, para analistas, o futuro de Cuba e o papel do Brasil no processo de abertura política do regime devem fazer parte da conversa.

 Para a historiadora Maria Aparecida Aquino, professora da USP, “é uma visita entre amigos, sim”, mas os interesses vão além da amizade entre Lula e Fidel:

– Por parte de Lula é uma visita a um velho amigo que se encontra extremamente doente [Fidel]. Mas há uma sinalização aí: do ponto de vista político, representa um apoio [ao regime cubano]. Cedo ou tarde, ocorrendo a morte do Fidel, Cuba terá mudanças. A proximidade do Brasil com Cuba pode ser um aceno às conquistas da revolução socialista em Cuba, como a questão da saúde pública.

O ex-embaixador do Brasil em Cuba Tilden Santiago diz que o reconhecimento de Fidel em relação à liderança de Lula (na América Latina) “é muito grande”. Tanto ele quanto a professora lembram que atualmente a América Latina tem uma série de governos de esquerda e, em menor ou maior grau, todos tiveram influência cubana.

Santiago, que atuou na ilha durante o primeiro mandato de Lula (2003-2006), é tido como figura próxima tanto do líder cubano como do presidente brasileiro. Ele já protagonizou cenas memoráveis, como quando tocou saxofone em um jantar para Fidel e Lula em Havana. Sobre o encontro de hoje entre os amigos, Santiago lembra que ambos são pessoas muito carismáticas:

– Com Lula e Fidel a conversa vai longe. Isso acontece com qualquer político que Fidel encontra. Eu já acompanhei a visita de vários brasileiros como o [ex-ministro da Casa Civil] Zé Dirceu, o ministro da Educação Fernando Haddad, [o ex-ministro da Cultura] Gilberto Gil e o [ex-ministro da Justiça] Tarso Genro. As conversas chegavam a durar três horas.

Fidel renunciou ao governo de Cuba em fevereiro de 2008, após 49 anos no poder. Em seu lugar ficou o irmão Raúl Castro, que fez pequenas aberturas, permitindo a venda de celulares na ilha comunista, por exemplo.

Desde o fim da União Soviética, em 1991, o país sofre com a economia em frangalhos e a infraestrutura precária e em decadência. Reintegrada à OEA (Organização dos Estados Americanos) e sob embargo dos Estados Unidos, Cuba pode dar às mãos ao Brasil, a nova potência regional, durante seu processo de abertura inevitável.

Abertura lenta, segura e gradual

Ironicamente, Lula vai a Cuba dar apoio a um processo de abertura parecido com o que ocorreu durante o fim da ditadura militar brasileira, ao qual se opunha. No fim dos anos 1970, o governo militar brasileiro classificou o processo como “abertura lenta, segura e gradual”. Diferentemente da quebradeira que ocorreu após a abertura dos regimes comunistas no leste europeu com o fim da União Soviética, os cubanos têm tido muito cuidado com o seu processo, diz a historiadora da USP: 

– É como um remedinho dado aos poucos, afetando pouco, com muita preocupação. A economia cubana não está preparada para uma abertura rápida.

 Maria Aparecida lembra que já há lideranças sendo preparadas para assumir o poder após os irmãos Castro. E o Brasil pode ter um papel importante nesse processo ao dar apoio ao regime cubano e eventualmente ter algum papel econômico no país:

– O Brasil hoje é um país importante, que não pode ser esquecido dentro das relações internacionais da Europa, dos Estados Unidos e não seria diferente na América Latina.

Um diplomata brasileiro, que pediu anonimato, afirmou:

– A visita é uma maneira de dizer que as relações entre os dois países estão em um bom momento. É uma forma de reafirmar a relação.

O interesse de Lula por Cuba tem servido como oxigênio para a ilha, asfixiada por uma crise de liquidez devido à redução do faturamento com o turismo e as exportações de níquel.

O presidente espera consolidar essa cooperação, para que se mantenha mesmo depois do final do seu mandato, em 2011. A fonte diplomática afirma:

– É uma mensagem para o seu sucessor (de Lula) de que a relação com Cuba é estratégica e importante, e de que ele deseja que a cooperação continue e se aprofunde.

Também nesta quarta-feira, Lula se reúne com o presidente Raúl Castro para avaliar as relações comerciais bilaterais e discutir a ajuda ao Haiti depois do terremoto de janeiro.

Amanhã de manhã, o presidente embarca para Porto Príncipe, a capital do Haiti, que foi devastado por um violento tremor em 12 de janeiro.

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