Formação de intérpretes da Língua Brasileira de Sinais começou nas igrejas em 1980

 Igrejas contribuem para o crescimento do mercado de trabalho dos intérpretes de libras

Desde os anos 1980, as Igrejas protestantes são o principal reduto de formação de intérpretes da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). É de lá que também surgem os primeiros pesquisadores sobre o assunto e, principalmente, a consciência da importância da comunicação com surdos por meio de sinais. É o que constata César Augusto de Assis Silva, cientista social e autor da tese de doutorado “Entre a deficiência e a cultura: Análise etnográfica de atividades missionárias com surdos”, defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
Segundo o pesquisador, a igreja foi a primeira instituição a promover esse tipo de educação, já que instituições laicas não abrangiam atividades para pessoas com deficiência auditiva. “Os protestantes (luteranos e batistas) foram os que tiveram atuação mais forte no trabalho missionário utilizando a LIBRAS porque trataram os sinais como uma linguagem que devia ser levada a sério. A igreja católica, que foi a primeira a promover a educação de surdos, historicamente prezou mais o ensino da oralidade, apesar de atualmente também utilizar sinais”, explica Assis Silva.

A partir desse pioneirismo das igrejas protestantes, surgiram os primeiros intérpretes e intelectuais dispostos a estudar a língua de sinais, que começaram a ocupar uma posição de grande relevância na relação entre surdos e não surdos, no movimento social, em instituições universitárias e no mercado. “Se uma pessoa com surdez quisesse reivindicar algo, falava com o intérprete, que fazia a tradução do que era dito. Essa foi uma das características que estimulou a atuação do intérprete como um profissional do mercado de trabalho”, diz o cientista social.

Atividade missionária

Analisando documentos históricos, dicionários e matérias de evangelismo, visitando ambientes com pessoas cristãs (igrejas, congressos e acampamentos) e entrevistando fiéis, pastores, padres, ativistas políticos, linguistas, pedagogos e intérpretes, Assis Silva notou que as atividades de evangelização com surdos desempenhavam um papel missionário muito semelhante às atividades de missões que são realizadas quando membros da igreja viajam para outros locais, a fim de levar o evangelho a outras culturas e outros contextos. “É possível entender essa atitude como uma tentativa de inserção no mundo das pessoas com surdez também, adaptando-se ao contexto delas. Isso foi realizado, sobretudo, pelos batistas”, conta o pesquisador.

Português para surdos

Assis Silva diz que as reivindicações políticas, desde os anos 1990, são pela promoção da educação bilíngue para pessoas com surdez. “De acordo com esse modelo de educação, a primeira língua que os surdos aprendem é a LIBRAS. O português deve ser aprendido como segunda língua”, explica.

O pesquisador conta que a mobilização pelo ensino e aprendizado da Língua Brasileira de Sinais está crescendo em todo o País. “Hoje há a cursos de graduação que formam tradutores e intérpretes em LIBRAS/português, bem como cursos de Letras LIBRAS. A conquista desse espaço é muito importante para a disseminação dessa língua e inclusão social de pessoas surdas”, diz.

Segundo Assis Silva, essas transformações vêm no bojo do reconhecimento legal da LIBRAS, por meio da Lei Federal 10.436, de 24/04/2002, regulamentada pelo Decreto Federal 5626, de 22/12/2005. Como o pesquisador demonstra em sua tese, agentes religiosos foram fundamentais para a consolidação dessa normatização jurídica da surdez.
Fonte: Esteta / Redação CPAD News

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