Por Ricardo Marques

Vitória da Conquista tem assistido a um debate no mínimo curioso nos últimos meses, acerca do projeto de lei de autoria do executivo municipal que cria a Fundação Pública de direito privado para gerir o Hospital Municipal Esaú Matos. Trata-se de um debate curioso, pois a oposição parlamentar e radiofônica no município historicamente comemorava as raras notícias de óbitos ou insucessos do hospital Esaú Matos, sempre tentando transformar casos de dramas pessoais em instrumentos de disputa política. Com a proposta do executivo de criar a Fundação Esaú Matos, essa mesma oposição mudou de lado e apontou que na face da Terra não haveria um hospital melhor do que o hospital municipal, e agora os “maus” da prefeitura queriam “privatizar o Hospital” para “prejudicar a população”. Contradição número um.

Vê-se aí a inconsistência do discurso oposicionista: a suposta “má” gestão municipal  que supostamente quer privatizar o hospital é a mesma que em 14 anos, fez com que a Saúde Pública em Vitória da Conquista saísse de 08 médicos com carga horária reduzida de 20h semanais para 298 médicos e 27 especialidades médicas; de 06 postos de saúde para 45 unidades de saúde, 52 postos de atendimento na zona rural, 38 equipes de saúde da família, 500 agentes comunitários, garantindo a cobertura de 63% da população, sendo 100% de cobertura da população rural; de 45.831 consultas médicas para mais de meio milhão de consultas, procedimentos e exames marcados por ano; de uma receita de R$167.593,37 para mais de R$ 83 milhões de receitas captadas; de 05 para 64 cirurgiões-dentistas, e mais de 400 mil consultas odontológicas; da falta de participação popular para a real participação da comunidade, com o efetivo funcionamento do Conselho Municipal de Saúde, e de mais 36 Conselhos Locais, totalizando 400 conselheiros de saúde, além dos delegados do Orçamento Participativo e da Ouvidoria da Saúde.

A verdade é que o Esaú não foi privatizado. No ponto de vista correto da administração pública, o que mudou foi o modelo de gestão: agora o Esaú Matos terá autonomia de gestão em aspectos fundamentais, gerando mais agilidade em seus serviços, e o melhor, será uma instituição pública, gerida com recursos públicos, com qualidade e gratuidade. Lançamos um desafio: quem tiver dúvidas, pode se dirigir ao Esaú Matos e perguntar se algum procedimento custa agora alguma quantia. Se no Esaú alguém cobrar por internamento ou parto, ou ida de alguma criança para a UTI neonatal, o PMDB e seu pré candidato está certo. Se os serviços continuam gratuitos, a prefeitura está com a verdade.

Num processo democrático recente e em construção como o brasileiro, temos a esperança de que o embate político permita a conscientização e criticidade dos cidadãos. E esse é um caso típico no qual os discursos falaciosos e sofismáticos devem ser desmascarados pela realidade e pela capacidade crítica dos cidadãos. E isso ocorreu, pois as movimentações contra a criação da Fundação reduziram-se a uma minoria parlamentar e a discursos histriônicos e isolados de uma imprensa que merece questionamento na justiça eleitoral, por antecipação de campanha e uso ostensivo de meio de comunicação para benefício de uma candidatura posta diariamente nas falas de seus programas.
Após a aprovação da criação da Fundação municipal, novamente o debate político se empobrece, com a repetição exaustiva e sem base real de que o Hospital está agora “privatizado”. Cabe o questionamento com relação à contradição do discurso do PMDB e de seu pré-candidato a prefeito: no último dia 22 de novembro, semana passada, a Câmara dos deputados aprovou o Projeto de Lei 1749/11, de autoria do Executivo, que cria a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) para administrar hospitais universitários federais. O relator do projeto, deputado Danilo Forte (PMDB-CE), apresentou substitutivo que exclui a possibilidade de a EBSERH ser constituída como sociedade anônima. “Vamos garantir que o controle total seja da União, e o patrimônio, 100% público”, afirmou. De acordo com o governo, o objetivo da nova empresa pública é resolver problemas na contratação de trabalhadores para cerca de 26 mil servidores de hospitais. A votação na Câmara foi conduzida pelo relator do PMDB, o mesmo partido que aqui é contra a criação da Fundação Esaú Matos em Vitória da Conquista. Toda a bancada do PMDB votou junto com o PT e os demais partidos da base pela aprovação do PL que cria a EBSERH.

No dia 23 de novembro, um dia depois, o Senado aprovou o mesmo projeto que cria a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), encarregada de administrar a gestão de 46 hospitais vinculados a universidades federais de todo o país. O projeto foi aprovado com 42 votos favoráveis e 18 contrários. De acordo com o relator, senador Humberto Costa (PT-PE), o capital da empresa será integralmente de propriedade da União. Ele ainda argumentou que a EBSERH seguirá todos os ritos e mecanismos de controle dispensados aos órgãos públicos. O PMDB também no Senado votou com o governo.

Vejamos agora o que diz o primeiro parágrafo do PL 1749/2011: “Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a criar empresa pública unipessoal, na forma definida no inciso II do art. 5º do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, e no art. 5º do Decreto-Lei nº 900, de 29 de setembro de 1969, denominada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH, com personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio, vinculada ao Ministério da Educação, com prazo de duração indeterminado.”

Cabe agora algumas perguntas: O PMDB de Conquista vai agora dizer que o PMDB nacional e toda sua bancada de deputados e senadores erraram, trairam e “privatizaram” os 46 hospitais federais? Ou o seu pré candidato será coerente e se desfiliará do PMDB por não concordar com o seu partido? A posição mais coerente deveria ser abandonar o partido que aprovou a criação de uma empresa que segundo ele privatiza os hospitais públicos. O pré candidato deveria ir para os partidos que defendem o que ele defende, como o PSOL, por exemplo.

A população de Vitória da Conquista não se deixará iludir com um discurso superficial e inverídico de uma oposição do PMDB que aqui vota contra o que eles votam no Congresso Nacional. Deveríamos ter uma oposição qualificada, que apresentasse um projeto para a cidade, e que não ficasse tentando iludir os cidadãos com uma posição que é o oposto do que eles fazem no plano nacional. A democracia precisa disso: de partidos coerentes, de políticos sérios, de oposições que sejam fortes e que tenham projeto, e não se limitem a ataques pessoais e discursos inverídicos.

*Ricardo Marques é administrador, especialista em Saúde Coletiva e Mestrando em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Leciona as disciplinas de Gestão Ambiental, Gestão Pública e Planejamento Urbano. Atualmente exerce o mandato de Vice Prefeito Municipal de Vitória da Conquista, Bahia.

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