O senador Roberto Requião (PMDB-PR) subiu há pouco à tribuna para se defender dos “ataques” virtuais que têm recebido de todo o Brasil desde ontem (segunda, 25), quando tomou à força o gravador de um repórter em plenário e, não satisfeito, apagou todo o conteúdo do cartão de memória, em que ficam gravadas as entrevistas – em flagrante caso de destempero, apropriação indébita de bem particular e violação de liberdade de imprensa. Em pouco menos de 10 minutos de discurso, Requião não recuou de sua atitude, reafirmou que não devolveria o material deletado e disse que foi vítima de “bullying público”.
“Entendi que não era mais uma entrevista, que havia nas perguntas doses de provocação, ao estilo CQC [Rede Bandeirantes] ou Pânico [Rede TV!]. O repórter queria como que me extorquir respostas, não para esclarecer o tema, mas para acuar o entrevistado, ao modelo desses programas que citei”, disse Requião, em resposta ao aparte do senador Eduardo Suplicy (PT-SP). “Fui alvo de uma provocação programada e reagi com irritação. Algumas vezes, senador Suplicy, a indignação é santa, e nós temos de pôr um fim a esse bullying público que todos sofremos pelo simples fato de, ganhando uma eleição, assumirmos um mandato público.”

Antes de se apossar do gravador, o ex-governador do Paraná falava sobre medidas antiinflacionárias quando o repórter quis saber se, caso o governo do estado implementasse uma política de contenção de gastos, ele abriria mão de sua aposentadoria vitalícia (R$ 24.117,62). Irritado, Requião, que é conhecido por seu temperamento irritadiço, tirou com um safanão o instrumento de trabalho da mão do jornalista. “Minha indignação foi muito grande, eu fui alvo de uma provocação programada”.

“[Disseram que] Tirei o gravador do repórter em uma tentativa de censurar a entrevista. Também não é verdade. A entrevista está toda ela na internet, postada por mim. Quis evitar que a entrevista fosse editada não confiando no repórter por ver nas perguntas dele uma tentativa de me pôr em armadilha. Quis assim eu mesmo ter o controle da entrevista publicando-a integralmente sem trucagens”, disse o senador. Ele alegou que ainda recebe a pensão vitalícia para sanar dívidas herdadas de outros governantes do Paraná, a quem chamou de “ladrões”. “Com danos pesados de economia pessoal e familiar, eu resolvi ficar com essa pensão.”

Durante o discurso, Requião demonstrou que as rusgas com a chamada grande imprensa datam de sua gestão como governador do Paraná. “O regime no Paraná era o regime de chantagem. Assumi e logo veio o recado: apanha o governo se não abrir as burras. A minha reação foi retirar da proposta orçamentária todos os recursos de publicidade. Eu fiquei sete anos e três meses sem dar uma entrevista ao vivo à Bandeirantes, à Globo, ao SBT ou a qualquer veículo de comunicação importante do Paraná”, acrescentou.

Depois do discurso, Requião deixou o plenário e, sem parar para falar com a imprensa, caminhou apressadamente em direção ao seu gabinete. “Isso tem de acabar, esse bullying que a imprensa faz com os parlamentares”, disse, na rara vez em que respondeu perguntas. Dizendo que protocolou, há cerca de 30 dias, um projeto para regulamentar o direito de resposta, Requião declarou que, desde a extinção da Lei de Imprensa, as pessoas estão desprotegidas ante às publicações ofensivas. “Estou reapresentando o projeto para garantir à parte que se julgar lesada acesso rápido aos meios de comunicação para o restabelecimento da verdade. A falta de um instrumento como este tem me deixado e a tantos brasileiros impossibilitados de defesa quando vítimas de informações não verdadeiras.”

O senador Lobão Filho (PMDB-MA) pediu aparte e tomou para si “a liberdade” de achar que Requião possa ter errado ao tomar o gravador. Mas ressaltou o valor do companheiro de partido e, minimizando o fato, disse que se trata de um “fato menor”. “Que fique claro que apenas me apossei do gravador para evitar a edição, uma edição de desmoralização de um parlamentar sério”, rebateu Requião.

Polícia Federal

Depois de passar a tarde e boa parte da noite de ontem (segunda, 25) postando declarações por vezes desaforadas a internautas, em seu microblog no Twitter, Requião resolveu publicar a entrevista, incluindo-se o instante em que profere palavrões contra o jornalista. Durante a entrevista que gerou o roubo, o repórter Victor Boyadjian insistiu em saber se não seria o caso de abrir mão da pensão vitalícia em nome do equilíbrio das contas públicas do Paraná.

O que se ouve em seguida à pergunta sobre a pensão é um barulho provocado pela retirada, à força, do gravador das mãos do repórter. “Calma! Não estou mais gravando. Espera aí, deixe-me desligar”, ainda tentou ponderar o jornalista. Em vão. “Não vai desligar mais porra nenhuma. Vou ficar com isso aqui”, diz o senador, já transtornado. A gravação é interrompida nesse ponto da conversa, mas o repórter diz que muito ainda foi dito ao passo em que o senador se retirava do plenário.

Depois de conceder diversas entrevistas no transcorrer do dia, em inversão de papéis, o jornalista resumiu seu estado de espírito. “Eu quero paz. Nunca fui numa delegacia. Será a primeira vez”, desabafou Victor à reportagem, ontem (segunda, 25) antes de se dirigir à Polícia Federal, onde registrou queixa contra o senador.

Antes, ele havia tentado registra denúncia na Polícia Legislativa do Senado – em vão: um agente disse que a polícia está impedida de formalizar denúncia contra o parlamentar, alegando ser esta uma atribuição da corregedoria da Casa, como define a resolução número 17/93 da Mesa Diretora. O detalhe é que a corregedoria, que teoricamente é responsável por apurar desvios de senadores, está desativada desde outubro.

Novo corregedor

Depois do episódio, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tratou de tomar as providências para pôr a corregedoria em funcionamento. Instantes depois do pronunciamento de Requião, Sarney sentou-se à cadeira central da Mesa Diretora e, sem receber objeções, anunciou o nome do senador Vital do Rêgo Filho (PMDB-PB) para ocupar deixado pelo então titular Romeu Tuma, morto em outubro de 2010.

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