A Comissão de Anistia do Ministério da Justiça aprovou, por unanimidade, o processo de anistia política do cineasta Glauber Rocha. Na sessão aberta ao público, na tarde desta quarta-feira (26), no Teatro Vila Velha, em Salvador, ficou definido também que a viúva do baiano, Paula Gaitán, receberá indenização de R$ 2 mil por mês, além dos R$ 234,6 mil, valor retroativo a 2001, quando foi criada a comissão.

Durante o julgamento do processo, a conselheira relatora, Luciana Garcia, fez a leitura do relatório que apontava as principais causas para a concessão da anistia. Entre os motivos citados estavam as perseguições e prisões sofridas por Glauber Rocha no período da ditadura militar, levando-o ao exílio e à censura de suas obras.

Logo depois, a relatora anunciou o seu parecer, que foi seguido pelos demais conselheiros. Os filmes censurados de Glauber foram “O dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro”, “História do Brasil”, “Cabeças Cortadas”, “Di Cavalcanti”, “Idade da Terra”, “Maranhão 66”, “Câncer”, “Claro” e “Pátio”.

O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, afirmou que a anistia concedida a Glauber representou a condenação a qualquer tipo de iniciativa que seja contra a liberdade de expressão. “Anistiar Glauber Rocha é pedir desculpas a todos os brasileiros que sofreram perseguição política, sendo obrigados a sair de suas casas, a abandonar suas famílias durante o regime militar”.

O ministro da Cultura, Juca Ferreira, foi testemunha no processo. Durante o ato, ele retratou a história e a importância do cineasta para a cultura brasileira. “É um momento importante e histórico para o Brasil. Glauber sofreu perseguições e, por causa disso, passou por diversas dificuldades financeiras. Seus filmes já não recebiam apoios e isto prejudicou muito sua carreira. É um momento de revisão da história do Brasil para evitarmos que tudo ocorra novamente”.

O processo de anistia de Glauber Rocha iniciou em 2006 pela filha Paloma Rocha. No julgamento, a família recebeu o perdão oficial reconhecido pelo governo federal, concluindo seu processo de anistia política. Bastante emocionada, a mãe do cineasta contou que sofreu muito na época ao ver Glauber ser perseguido pelos militares. “Foram anos difíceis dos quais eu jamais me esquecerei. Meu coração está acelerado e feliz. Tenho certeza que, onde meu filho estiver, estará em paz agora”.

Para o governador Jaques Wagner, a anistia é uma maneira de se fazer justiça e um reconhecimento à luta do cineasta a favor da liberdade de expressão. “Estamos fazendo o resgate da história, reconhecendo os nossos heróis. Espero que seja feita justiça com todos os brasileiros perseguidos políticos da época. A anistia é também uma maneira de dizermos que não queremos que este período de ausência de democracia retorne”.

Desde que foi criada, a comissão julgou 55 mil requerimentos de anistia política. Em 14 mil casos houve algum tipo de reparação econômica, e em 22,5 mil processos houve apenas o pedido oficial de desculpas do estado. Dezoito mil pedidos de anistia foram negados.

No total, foram concedidos aproximadamente 2,4 bilhões em reparações econômicas. Há 11 mil processos na comissão aguardando análise em primeira instância e outros 3,5 mil pedidos de recurso. Nos últimos três anos, a comissão analisou 10 mil processos por ano.

Reparações a qualquer tempo

As reparações por causa de violações a direitos humanos podem ser requeridas a qualquer tempo. A Lei 10.559/2002 diz que são anistiáveis, com reparação financeira, as pessoas que sofreram perseguição, no período de 18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988.
As motivações devem ser exclusivamente políticas e os ex-perseguidos atingidos por atos de exceção (como os atos institucionais), punidos com transferência ou perda de comissões já incorporadas, demitidos, compelidos ao afastamento ou impedidos do exercício de atividade profissional remunerada.

A indenização pode ser paga de uma única vez, com o valor máximo de R$ 100 mil (pagos a quem não pode comprovar vínculo laboral) ou mensalmente em prestações continuadas e permanentes em valor igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se estivesse na ativa, considerando eventuais promoções que teria direito na carreira. Nesse caso, há possibilidade de uma indenização retroativa a 5 de outubro de 1988.

A anistia política ainda prevê a possibilidade de retorno ao curso superior do qual tenha sido expulso, contagem de tempo de trabalho no exterior para fins de aposentadoria ou inclusão do nome do pai/mãe na certidão de nascimento dos filhos.

Vila Velha foi casa de artistas glauberianos

A escolha do Vila Velha como palco da cerimônia foi uma decisão da Comissão de Anistia, por meio da 37ª. Caravana da Anistia. O teatro foi sede da Anistia Internacional, além de ter sido a casa de artistas “glauberianos” como Mário Gusmão, Sônia dos Humildes, Carlos Petrovicht e Othon Bastos, – os três últimos trabalharam em “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964), um dos filmes mais emblemáticos de Glauber Rocha.

Entre 1969 a 1976, o cineasta ficou fora do país, mudando diversas vezes de endereço. Na Universidade Columbia, em Nova York, apresentou a tese “Eztetyka do Sonho”. No Chile, filmou um documentário sobre os brasileiros exilados, que não foi concluído. Glauber faleceu na cidade do Rio de Janeiro, no dia 22 de agosto de 1981, aos 42 anos, vítima de choque bacteriano provocado por broncopneumonia. AGECOM/BA

Compartilhe