Do G1, em São Paulo

O ano de 2010 registrou uma sucessão de recordes positivos no país em matéria de trabalho. A taxa de desemprego (5,7% em novembro) é a menor desde 2002 e a criação de 15 milhões de vagas formais no governo Luiz Inácio Lula da Silva foi bandeira de campanha da presidente eleita, Dilma Rousseff (PT).

Há, contudo, características do mercado de trabalho brasileiro, como os níveis de informalidade e rotatividade, que são problemas a serem enfrentados pelo próximo governo.

Embora o trabalho com carteira assinada esteja crescendo no país, a informalidade ainda é elevada. São 15,3 milhões de trabalhadores sem carteira (28,2% do total de empregados), segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“E parte do que chamamos de informalidade é ilegalidade: relações de emprego disfarçadas em contratos de pessoa jurídica, estagiário, cooperativado”, afirma José Dari Krein, coordenador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit) da Unicamp.

Desafios do governo Dilma
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Para o especialista em economia do trabalho, o governo deve aprimorar os mecanismos de combate ao “emprego disfarçado”, mediante maior fiscalização e penalização econômica a contratações irregulares, e incentivar a cobertura legal a formas de ocupação não assalariadas (trabalho autônomo, por conta própria, entre outras).

“Há empresas que usam a informalidade como estratégia para ganhar competitividade, o que é concorrência desleal”, diz Krein.

Rotatividade é uma das mais altas do mundo
O alto nível de rotatividade no emprego é outra característica negativa do mercado de trabalho brasileiro.

O tempo médio de permanência do funcionário no emprego no país é de somente 5,1 anos, apontou estudo recente do Dieese encomendado pelo Ministério do Trabalho. Em países desenvolvidos, fica em torno de oito anos. Entre 2003 e 2008, o percentual de assalariados com menos de um ano no posto subiu de 29,6% para 33,9%.

Há quem sustente que os benefícios financeiros oferecidos no país ao assalariado demitido (FGTS, 40% de multa e seguro-desemprego) incentivam a rotatividade. “Quando o trabalhador não é qualificado, a perspectiva de crescimento de salário é muito pequena, e acaba valendo a pena ser demitido”, diz o economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos.

A própria divisão em torno do tema dá a medida do desafio do próximo governo. “Se essa tese [benefícios na demissão induzem rotatividade] fosse verdadeira, o setor informal deveria ter contratos duradouros”, rebate Krein, da Unicamp.“Grande parte da rotatividade é por iniciativa do empregador”, reforça Clemente Ganz, diretor técnico do Dieese, que defende atenção específica para setores em que a rotatividade é comum, como a construção civil.

Jovens sonham com carteira assinada
Exemplos de informalidade e rotatividade no trabalho multiplicam-se pela região da Rua 25 de Março, maior centro de comércio popular de São Paulo. Em meio à correria das compras de fim de ano, trabalhadores informais torciam por um 2011 com emprego registrado.

Como o carregador Danilo Lobo de Oliveira, 23 anos, que diz trabalhar oito horas diárias de segunda a sábado por R$ 650 mensais. É o segundo emprego dele, que antes fora registrado por seis meses como atendente de lanchonete. “Trabalho para um chinês. É difícil eles assinarem [carteira]”, diz.

Danilo vê o seguro-desemprego como a vantagem do emprego registrado. E, diz, decidido: “Vou arrumar outro emprego no ano que vem, de preferência com carteira.”

Inflação e real forte impactam cenário econômico
O futuro de Danilo e de milhões de brasileiros no mercado de trabalho está atrelado ao rumo geral da economia brasileira, entre fatores como a pressão inflacionária e a valorização excessiva do real.

Puxado por uma alta dos alimentos, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 0,83% em novembro, acumulando alta de 5,25% no ano, acima do centro da meta fixada pelo Banco Central, de 4,5%.

Em dezembro, como medida para conter a alta dos preços, o BC restringiu modalidades de crédito e retirou R$ 61 bilhões da economia via aumento do compulsório, o dinheiro dos bancos que fica depositado no BC. Com isso, conseguiu manter a taxa básica de juros em 10,75% na última reunião do Comitê de Política Monetária.

Um aumento de juros poderia afetar o crescimento e a geração de empregos”
José Márcio Camargo
economista

Após ter elevado o gasto público por dois anos como forma de enfrentar a crise mundial (em 2010, o aumento até agora é de 27%), o governo já anuncia cortes nas despesas para 2011, em um cenário de desaceleração da atividade econômica – sua previsão é de crescimento de 5% para 2011.

Mas os planos de Danilo e de milhões de brasileiros podem ser afetados caso o governo tenha que recorrer ao aumento de juros para segurar a inflação, avalia José Márcio Camargo, da Opus.

“Um cenário de enorme liquidez internacional geraria aumento no preço das commodities [produtos primários como minérios, soja e petróleo, com preço fixado pela oferta e procura internacionais] e das pressões inflacionárias no Brasil. O BC poderia ter que aumentar os juros, afetando o crescimento e a geração de empregos”, diz.

No corre-corre da Rua 25 de Março, parece prevalecer o otimismo de trabalhadores como o auxiliar de vendas Carlos Henrique de Oliveira, 17 anos, que recebe R$ 200 semanais para atrair compradores a uma loja de roupas. “É melhor registrado, mas por enquanto [o trabalho informal] é o que está rolando”, afirma.

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