“Os dois sistemas usados para eleger os congressistas brasileiros têm virtudes e imperfeições. Mas eles parecem se complementar um ao outro de forma razoavelmente funcional”

O nosso glorioso Congresso Nacional é composto por 81 senadores e por 513 deputados federais. Nas eleições de outubro, serão renovados os mandatos de 2/3 dos membros do Senado Federal e da totalidade dos integrantes da Câmara dos Deputados.
Essa será a sétima eleição parlamentar geral desde o final do regime militar. Apesar disso, muitos eleitores ainda não entendem direito as diferenças entre os critérios utilizados para a eleição dos senadores e dos deputados federais. Esta coluna foi escrita para tentar esclarecer essas dúvidas.
O nosso Poder Legislativo é bicameral. A Câmara Alta (Senado) representa os 27 estados da federação – e os senadores são selecionados em eleições majoritárias. Por sua vez, a Câmara Baixa (Câmara) representa os 190 milhões de brasileiros – e os deputados são eleitos por intermédio de um sistema proporcional.
Antes de falar das diferenças, vale mencionar uma característica em comum dos dois tipos de eleição. No Brasil, tanto senadores como deputados são eleitos pelos colégios eleitorais estaduais. Em outras palavras, os estados da federação funcionam como circunscrições eleitorais nos dois casos. Nos EUA e em outros países, ao contrário, apenas os senadores são eleitos estadualmente. Os deputados representam subdivisões territoriais dos estados (também chamadas de distritos).
Os critérios para a eleição de senadores são bem mais intuitivos para o eleitor comum. Cada partido poderá lançar até 2 candidatos ao Senado por estado (todos elegerão uma dupla de novos senadores em 2010). Cada eleitor poderá votar em até 2 candidatos (mas esses votos não podem ser cumulativos). Os senadores eleitos em cada estado serão os dois candidatos individualmente mais votados. A regra majoritária é simples assim.
Por outro lado, o sistema que utilizamos para eleger os deputados federais é proporcional. A lógica desse sistema não é individual, e sim partidária. A votação individual de cada candidato é menos decisiva que a votação de seus partidos. Grosso modo, uma legenda que obtenha x% dos votos válidos elegerá x% dos deputados dentro daquele estado.
Cada partido pode lançar tantos candidatos quanto o número de cadeiras na Câmara que estiverem sendo disputadas (70 no caso de São Paulo, 53 em Minas Gerais, 46 no Rio de Janeiro, e assim por diante). A votação mínima necessária para a eleição de um deputado é chamada de quociente eleitoral. Suponha um estado imaginário com 500 mil votos válidos (A) e que eleja 10 deputados (B). O quociente eleitoral naquela circunscrição será, portanto, de 50 mil votos (A dividido por B).
O número de deputados eleitos por cada partido será determinado com base no número de vezes em que ele atingir o quociente eleitoral. No exemplo acima, uma sigla cujos candidatos obtenham 100 mil votos elegerá 2 deputados federais. Para ser preciso, os dois mais votados individualmente da sua lista de candidatos.
É justamente por conta desse procedimento complicado que, ao menos teoricamente, candidatos que tiveram menos votos podem ser eleitos derrotando candidatos que tiveram mais votos. Basta que os primeiros pertençam a partidos com um desempenho agregado superior aos partidos dos segundos. A regra é clara!
Quando entendemos o modo pelo qual um sistema eleitoral funciona, fica mais fácil evitar o desperdício do nosso voto. Como a eleição dos senadores é majoritária, os eleitores têm incentivos para praticar o chamado voto útil (escolhendo candidatos individualmente competitivos). E, como a eleição dos deputados é proporcional, os incentivos são para que escolhamos os melhores candidatos dos partidos mais competitivos – permitindo uma escolha mais “sincera” do que no caso anterior.
Os dois sistemas usados para eleger os congressistas brasileiros têm virtudes e imperfeições. Mas eles parecem se complementar um ao outro de forma razoavelmente funcional. É pouco provável que sejam drasticamente alterados nas eleições futuras.

*Consultor político, coordenador de Estudos e Pesquisas do Centro deLiderança Pública (CLP) e Doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). Foi professor da Universidade de São Paulo (USP), da PUC-SP e da Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Publicou o livro “Partidos políticos do Brasil: 1945-2000” (Jorge Zahar Editor, 2000) e co-organizou a coletânea Partidos e coligações eleitorais no Brasil (Unesp/Fundação Konrad Adenauer, 2005).

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